A morte do menino Benício Xavier, de apenas 6 anos, vítima de um suposto erro médico em Manaus, deixou um rastro de dor que se estende muito além de sua família. O luto também atingiu em cheio seus colegas de escola, especialmente seu melhor amigo, Pedro, que agora precisa aprender a lidar com uma ausência profunda e incompreensível para sua idade.
O laço de amizade e o vazio da perda
Em um relato emocionante compartilhado nas redes sociais pelo pai de Benício, Bruno Freitas, a mãe de Pedro, Thays Carioca, descreveu a forte conexão entre as duas crianças. Eles estudavam juntos e compartilhavam a rotina escolar diária, criando memórias que agora são fonte de saudade e dor.
"'Mamãe, faz dois sanduíches? Meu amigo gosta do meu lanche e eu divido com ele'. E assim, todos os dias tinha pão com Nutella para Pedro e Benício", escreveu Thays, lembrando de um simples hábito que simbolizava a cumplicidade entre eles. A amizade era tão próxima que até as fantasias para eventos na escola eram combinadas pelas mães.
O choque para Pedro começou antes mesmo da morte do amigo. Ao ver mensagens no grupo de mães da escola mencionando que Benício havia sido levado para a UTI, o menino perguntou o significado da sigla. Após a explicação da mãe, Pedro se ajoelhou no quarto e orou com fervor pela melhora do colega. Ao acordar no dia seguinte, sua primeira pergunta foi se o amigo já estava melhor, momento em que Thays precisou contar a trágica notícia.
Impacto profundo no cotidiano da criança
A mãe de Benício, Joyce Xavier, confirmou a intensidade daquela amizade. Ela explicou ao g1 que Pedro foi o primeiro grande amigo do filho na nova escola, criando um laço imediato e forte. A proximidade das crianças fez com que as famílias também se aproximassem.
Com o retorno às aulas após o falecimento de Benício, Pedro sentiu profundamente a ausência. "Ele voltou para a escola e ainda tinha uma semana de aula. Sentiu muito. O Benício não estava lá para dividir o lanche, para brincar. Ele ficou abalado, deixou de comer o pão com Nutella que amava, deixou de se alimentar direito", relatou Joyce.
Um dos momentos mais marcantes para Joyce ocorreu durante o velório do filho. Ao abraçar Pedro, que tinha a mesma altura e físico de Benício, ela reviveu a sensação de segurar o próprio filho. Mais tarde, a mãe de Pedro contou que, em casa, o menino questionou: "mãe, será que a mãe do Benício não quer meu abraço?".
Os fatos do caso e a investigação em andamento
Benício foi levado ao Hospital Santa Júlia, em Manaus, no dia 22 de novembro, com tosse seca e suspeita de laringite. Segundo a família, o protocolo de atendimento incluía lavagem nasal, soro, xarope e a aplicação de três doses de adrenalina intravenosa de 3 ml a cada 30 minutos, realizadas por uma técnica de enfermagem.
O pai, Bruno Freitas, questionou a aplicação da adrenalina pela veia, já que o filho só a havia recebido por nebulização anteriormente. A técnica teria afirmado que o procedimento estava prescrito, embora ela mesma nunca o tivesse feito daquela forma.
O estado de Benício se agravou rapidamente. Ele ficou pálido, com membros arroxeados, reclamou que "o coração estava queimando" e sua saturação caiu para cerca de 75%. Transferido para a sala vermelha e depois para a UTI por volta das 23h, o menino sofreu seis paradas cardíacas durante a intubação. Benício morreu às 2h55 do dia 23 de novembro.
A investigação do caso, conduzida pelo delegado Marcelo Martins, trata o ocorrido como homicídio doloso qualificado, considerando a possibilidade de crueldade. O Conselho Regional de Medicina do Amazonas (CREMAM) abriu um processo ético sigiloso para apurar a conduta da médica Juliana Brasil Santos. Tanto a médica quanto a técnica de enfermagem Raiza Bentes foram afastadas pelo hospital.
A defesa de Juliana afirma que a médica reconheceu o erro "no calor do momento" e alega que uma falha no sistema automatizado do hospital teria alterado a via de administração da adrenalina registrada por ela. Um vídeo foi apresentado para demonstrar problemas na plataforma. A técnica de enfermagem, em acareação com a médica, reforçou sua versão de que estava sozinha e sem auxílio durante o procedimento. O hospital informou que não vai se manifestar sobre o caso.