Uma decisão do ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), está gerando forte reação entre especialistas em direito econômico e criminal. Toffoli determinou a realização de uma acareação, marcada para a próxima terça-feira, 30 de dezembro, às 14h, envolvendo figuras centrais no inquérito sobre o Banco Master.
Uma decisão considerada prematura e inusual
A audiência por videoconferência vai reunir o dono do banco, Daniel Vorcaro, o ex-presidente do BRB, Paulo Henrique Costa, e o diretor de fiscalização do Banco Central, Ailton de Aquino. O objetivo é que eles detalhem suas versões sobre a derrocada da instituição financeira.
O ponto que mais causa estranheza entre os juristas é o timing da medida. A acareação foi convocada antes que os investigados e as testemunhas prestem seus depoimentos individuais, o que é considerado uma quebra na sequência lógica das investigações. "O ministro causou uma impressão muito ruim porque ninguém sequer foi ouvido até o momento", critica o advogado Eduardo Reale, especialista em Direito Criminal Econômico, que classifica a decisão como abusiva e ilegal.
Riscos para a apuração e possíveis consequências
André Santa Cruz, professor doutor em Direito Empresarial, acende um alerta sobre o perigo de a medida atrapalhar, em vez de ajudar, a investigação. "O risco é que o ato deixe de cumprir sua função de depuração de versões e passe a permitir a construção ou o ajuste simultâneo de narrativas", explica. Ele argumenta que, ao antecipar o confronto, linhas investigativas ainda em formação são expostas prematuramente.
A própria Procuradoria-Geral da República (PGR) se posicionou contra a audiência, argumentando que ela é prematura e pedindo sua suspensão por tempo indeterminado. O pedido, no entanto, foi negado por Toffoli na noite de quarta-feira, 24 de dezembro.
Um dos temas centrais do encontro será a atuação do Banco Central que levou à liquidação do Banco Master em novembro. Enquanto Vorcaro deve defender que havia alternativas à liquidação, Aquino, do BC, deve reforçar os motivos técnicos da decisão.
Reversão da liquidação é risco remoto, mas não inexistente
Especialistas consultados pela reportagem avaliam que o maior risco, ainda que considerado remoto, seria Toffoli concluir que houve vícios graves na atuação do BC e tentar pressionar pela reversão da liquidação. "Ele pode comprar a versão de Vorcaro, mas ainda assim não é algo simples de sustentar", pondera Eduardo Reale.
É importante destacar que, em casos como esse, o papel do Judiciário é verificar aspectos como competência, regularidade do procedimento e motivação da autarquia. Não cabe ao STF reavaliar o mérito de decisões técnicas sobre a saúde financeira do banco. "A reversão judicial só seria admissível diante de vícios graves e objetivos, como ilegalidades ou violações ao devido processo administrativo", esclarece Santa Cruz.
O contexto também inclui alegações de que o ministro Alexandre de Moraes teria ligado para o presidente do BC, Gabriel Galípolo, para tratar do caso – algo que Moraes negou formalmente. Reale sugere que a acareação convocada por Toffoli poderia ser uma maneira de "desviar o foco" dessa questão específica.
A situação do Banco Master ainda está em fase inicial, com o liquidante, Eduardo Felix Bianchini, sequer tendo enviado a lista final de credores ao Fundo Garantidor de Créditos (FGC). Especialistas afirmam que, sem um panorama completo dos números, qualquer análise definitiva é precipitada.