Quando suspeitas de riqueza não declarada surgem, seja em uma separação conturbada, uma disputa entre sócios ou uma investigação de fraude, a auditoria patrimonial se torna uma ferramenta fundamental. Este mecanismo especializado tem o poder de rastrear bens escondidos, reconstruir a trajetória do dinheiro e fornecer base sólida para decisões judiciais.
O que é e quando a auditoria patrimonial é acionada
Trata-se de um levantamento minucioso de todos os bens, direitos e participações de uma pessoa ou empresa. O processo cruza uma vasta gama de dados, tanto públicos quanto privados, para revelar o que não está visível em uma análise superficial. A advogada Mariana Pimentel, sócia-diretora da área de Direito de Família e Planejamento Sucessório do Medina Guimarães Advogados, explica que a auditoria se torna crucial em cenários com patrimônio complexo.
"Em relacionamentos com estruturas societárias, holdings, posses no exterior ou quando a administração financeira fica concentrada em apenas uma das partes, a auditoria passa a ser essencial", afirma a especialista. Ela contrasta essa situação com casais de classe média, onde os bens costumam ser mais transparentes.
Casos famosos e o papel crescente da tecnologia
A prática ganhou mais visibilidade na mídia devido a casos envolvendo celebridades e grandes fortunas. Reportagens mencionaram que a separação da influenciadora Virginia Fonseca e do cantor Zé Felipe teria envolvido um pedido desse tipo de auditoria. Outro exemplo citado é o da atriz Larissa Manoela, onde uma auditoria poderia ser usada para prestação de contas da gestão dos bens feita pelos pais durante sua menoridade.
O advogado André Camara, sócio da área societária do Benício Advogados, destaca que a tecnologia transformou radicalmente esse campo. "A ocultação de bens sempre aconteceu, mas era difícil comprovar", diz. Com a digitalização de bases públicas, a inteligência artificial permite cruzar dados que um humano levaria um tempo imenso para analisar, agilizando e aprofundando as investigações.
Ferramentas judiciais e as consequências da fraude
A auditoria em si não quebra sigilos bancários ou fiscais. Seu papel é organizar indícios concretos para que o Judiciário autorize o acesso a informações mais sensíveis. Com uma justificativa robusta, o juiz pode permitir o uso de sistemas como InfoJud, Renajud e SisbaJud para cruzar dados fiscais, bancários e patrimoniais.
As consequências de esconder bens podem ser severas. No direito de família, se a sonegação for comprovada após a partilha, a parte que ocultou o bem pode perdê-lo integralmente, em uma penalidade conhecida como pena de sonegados. Também pode haver multa por litigância de má-fé. No âmbito corporativo, as auditorias são amplamente usadas para investigar fraudes internas e identificar devedores que tentam dissolver seu patrimônio antes de uma execução judicial.
"Na verdade, o maior uso de auditorias é em caso de fraudes corporativas", afirma André Camara. Ele relata um caso recente em uma grande corporação brasileira, que desconfiou de um executivo e iniciou uma apuração interna monitorando e-mails corporativos, ligações telefônicas e notas fiscais para mapear possíveis desvios.
O mecanismo também é acionado por grandes credores. No caso do banqueiro Daniel Vorcaro, ligado ao Banco Master, credores podem buscar rastrear transferências irregulares de patrimônio para tentar reduzir perdas que superam a cobertura do Fundo Garantidor de Créditos.
Como resume a especialista, a auditoria patrimonial serve para levantar todos os dados necessários e refletir a totalidade do patrimônio, desvendando estruturas criadas com "laranjas", pessoas jurídicas ou bens no exterior. "Não existe crime perfeito. Sempre ficam pontas soltas. Só que umas são mais fáceis, outras mais difíceis de encontrar", conclui.