PT lança manual para militância nas redes e orienta evitar termos como 'fascista' e 'corrupto'
PT orienta militantes a evitar chamar Bolsonaro de fascista e corrupto

O Partido dos Trabalhadores (PT) divulgou um manual de 93 páginas destinado a orientar sua militância e influenciadores digitais sobre como atuar nas redes sociais durante o período eleitoral, com foco nas disputas de 2026. O documento, intitulado "Manual de Apoio aos Influenciadores Ativistas Digitais – Pode Espalhar", tem como objetivo principal equilibrar a disputa digital, arena onde a direita tem tido vantagem, mas com cautela para evitar processos judiciais.

Mudança na estratégia de comunicação

Um dos pontos mais notáveis do guia é a recomendação para que os militantes petistas evitem termos considerados juridicamente arriscados ao se referirem ao ex-presidente Jair Bolsonaro e ao bolsonarismo. Após anos utilizando expressões como "fascista" e "corrupto" nas redes, o partido agora aconselha a adoção de uma linguagem mais cautelosa.

O manual sugere substituições específicas. Em vez de chamar diretamente alguém de "fascista", por exemplo, a orientação é apontar "características autoritárias do discurso" ou utilizar frases como "esse discurso se aproxima ou remete ao fascismo histórico". Curiosamente, o próprio texto comete um erro de grafia, escrevendo "FACISTA" em letras maiúsculas.

Quanto a acusações de corrupção, o documento é enfático: "Não pode – Atribuir crimes sem prova (ex.: 'Bolsonaro é corrupto')". A recomendação é vincular qualquer crítica a investigações ou denúncias já em curso, sempre evitando o uso de dados pessoais de adversários, como endereços ou informações sobre familiares.

Promessa de suporte jurídico e rede de apoio

Para dar segurança aos militantes que seguirem as orientações, o PT promete suporte legal. A promessa foi antecipada em julho pelo presidente da Fundação Perseu Abramo (FPA), Paulo Okamotto, que afirmou que seria formada uma equipe de advogados para garantir a segurança jurídica dos ativistas.

O manual reforça esse compromisso: "Use a rede de apoio: acione coletivos jurídicos e partidos; há advogados militantes e atuantes, a assistência pode ser prestada também pela Defensoria Pública". A FPA, vale ressaltar, é financiada com recursos do partido.

Henrique Lopes, influenciador que contribuiu com a criação do manual, destacou a complexidade do combate à extrema direita no ambiente digital. "A atuação diária contra a extrema direita é complexa, porque eles frequentemente são os primeiros a cometer crimes virtuais e a recorrer ao assédio judicial contra quem os confronta", disse. Ele classificou o projeto como positivo, por garantir "informação segura" com o apoio do PT, da FPA e de movimentos sociais.

Contradições e dados questionáveis no documento

Apesar do cuidado com a linguagem para evitar processos, o manual divulgado pelo PT apresenta informações internamente contraditórias. Na introdução, o texto afirma que as fraudes no INSS "começaram no governo de Jair Bolsonaro".

Contudo, essa afirmação entra em conflito com declarações anteriores do próprio partido. Em agosto deste ano, o PT afirmou que as "fraudes bilionárias contra aposentados e pensionistas do INSS [...] começaram a ganhar forma ainda em 2016, no governo Michel Temer, e se consolidaram definitivamente sob Bolsonaro".

O manual também busca destacar conquistas do governo Lula, afirmando que, em seu terceiro mandato, o presidente "retirou 26 milhões de pessoas da extrema pobreza no Brasil". No entanto, dados oficiais do próprio governo, divulgados posteriormente, mostram números diferentes: entre 2023 e 2024, 8,6 milhões saíram da pobreza e 1,9 milhão deixaram a extrema pobreza, segundo o IBGE.

O contexto da disputa digital

A publicação do manual ocorre em um cenário onde a direita, particularmente o bolsonarismo, é percebida como dominante no ambiente das redes sociais desde a campanha vitoriosa de Jair Bolsonaro em 2018. O documento cita o ex-presidente 18 vezes e o presidente Lula 21 vezes, indicando o foco no embate político central.

O objetivo declarado é fornecer um roteiro para ataques ao bolsonarismo na internet que sejam eficazes, mas que ao mesmo tempo escapem de ações judiciais bem-sucedidas por parte de adversários. A estratégia reflete uma preocupação crescente com o chamado "lawfare" ou assédio judicial no contexto das disputas políticas online.

A iniciativa ilustra a profissionalização da guerra política digital no Brasil, com partidos buscando estruturar e orientar sua base militante de forma organizada, antecipando-se ao intenso ciclo eleitoral que se aproxima em 2026.