Um experimento social realizado nas ruas do centro de Campinas, no interior de São Paulo, demonstrou de forma prática e visceral como as palavras que ouvimos causam reações imediatas no corpo e nas emoções. A ação, que integra a série especial "O poder das palavras" da EPTV, afiliada da TV Globo, convidou transeuntes a ouvirem dois tipos de mensagens através de fones de ouvido: uma composta por frases ofensivas e outra repleta de mensagens de incentivo e carinho.
Reações Imediatas: Do Desconforto à Emoção
As respostas aos áudios negativos foram unânimes em expressar mal-estar. Uma participante afirmou ter se sentido "ofendida e rebaixada", enquanto outra reagiu com veemente negação: "Não sou nada disso". O impacto no estado de espírito também foi destacado, com uma terceira pessoa comentando que o conteúdo "coloca a pessoa num baixo astral" e transmite uma sensação de derrota, minando a vontade de conquistar objetivos.
O cenário mudou radicalmente quando o mesmo grupo foi exposto a elogios e palavras de apoio. As expressões faciais e corporais se transformaram. "Nossa, forte, tudo de verdade. Essa sou eu", exclamou uma das voluntárias. Outra se emocionou visivelmente, declarando: "Agora eu fiquei emocionada e aceito, recebo e agradeço". A rápida transição entre os dois estados evidenciou o poder transformador da linguagem.
A Neurociência Por Trás das Palavras
O médico neurologista Fabrício Borba, com residência pela Unicamp, explica que essas reações são mediadas por neurotransmissores, substâncias químicas responsáveis pela comunicação entre os neurônios. "O neurônio joga para o outro, o outro pega e ele entende e aí gera uma descarga, um evento que vai levar uma emoção, uma memória, um movimento", detalha o especialista.
O processo é desencadeado no exato momento em que o som da palavra é captado e traduzido pelo cérebro. Essa informação sonora ativa diferentes regiões cerebrais através de uma complexa rede de comunicação neuronal, podendo resultar em respostas emocionais, motoras ou na formação de memórias. "Sem dúvida, realmente a palavra tem um poder bem grande", conclui o neurologista, enfatizando como um simples estímulo auditivo pode acionar desde o córtex occipital, relacionado à visão, até as vias motoras.
Do Experimento às Consequências no Ambiente de Trabalho
Se em uma dinâmica pontual as palavras já provocam alterações perceptíveis, no ambiente corporativo seus efeitos são amplificados e podem ter consequências duradouras. A psicóloga Fátima Macedo, especialista no tema, alerta que a comunicação no trabalho impacta diretamente a produtividade e a saúde mental dos colaboradores.
Ela explica que as palavras carregam um enorme poder de destruição ou de crescimento. "Aquilo que a gente recebe desde a nossa infância, aquilo que é falado para a gente, a gente vai registrando", afirma. Crenças formadas na infância, inclusive por experiências de bullying, são levadas para a vida adulta e podem ser reforçadas no ambiente profissional.
Ambientes focados exclusivamente em cobranças e metas numéricas, segundo a psicóloga, podem sufocar a criatividade. "Ativa regiões do cérebro que fazem reduzir a produtividade. Exato, porque você deixa de ter uma ideia criativa para você solucionar aquele problema", pontua Fátima Macedo. Muitos profissionais, com medo de serem mal interpretados, deixam de contribuir com suas ideias, um prejuízo tanto individual quanto para a empresa.
Burnout e Afastamentos: Os Números Alarmantes
Os impactos negativos da comunicação tóxica transcendem o desconforto e chegam a gerar dados concretos de saúde pública. Casos de burnout, distúrbio mental ligado ao estresse crônico no trabalho, são uma grande preocupação.
Dados revelam a gravidade do problema apenas no estado de São Paulo: no primeiro semestre de 2025, 842 pessoas se afastaram do trabalho devido a palavras ouvidas de chefes e colegas, ou até pela falta de comunicação. Em Minas Gerais, o número de afastamentos por motivos similares foi de 494.
Fátima Macedo ressalta o peso desproporcional da fala de um líder. "Tem estudos sobre isso. Que aquilo que uma liderança fala é mais importante até do que o que o terapeuta fala, do que o que o cônjuge fala", alerta. A forma como a autoridade se comunica pode, portanto, ser um fator decisivo para o bem-estar ou o adoecimento da equipe.
A série "O poder das palavras" continua sendo exibida até o dia 3 de janeiro de 2026, na 1ª Edição do Jornal da EPTV, trazendo mais reflexões sobre como a linguagem molda nosso dia a dia, nossas relações e nossa saúde mental.