Em um caso que mistura sucessão municipal e medidas judiciais restritivas, o presidente da Câmara Municipal de Turilândia, no Maranhão, assumiu interinamente o comando do Executivo local. A mudança ocorre enquanto ele próprio cumpre prisão domiciliar e é investigado por suposta participação em um esquema de corrupção que teria desviado mais de R$ 56 milhões dos cofres públicos.
Sucessão em meio a investigação
José Luís Araújo Diniz, conhecido como "Pelego" (União Brasil), tornou-se prefeito interino após decisão do Tribunal de Justiça do Maranhão (TJMA) que afastou o prefeito titular, Paulo Curió (União Brasil), e a vice-prefeita, Tânya Mendes (PRD). A portaria que oficializou a vacância temporária dos cargos foi publicada na sexta-feira, dia 26 de abril.
Com a ida de Pelego para a prefeitura, a vice-presidente da Câmara, a vereadora Inailce Nogueira Lopes, passou a exercer interinamente a presidência do Legislativo municipal. Curiosamente, ela também está sob prisão domiciliar, medida aplicada após audiência de custódia.
Limites da prisão domiciliar
A situação gerou dúvidas sobre a legalidade de um vereador investigado e com restrições de locomoção assumir o cargo máximo do Executivo. Para esclarecer, o g1 ouviu o promotor Fernando Berniz, do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco).
Segundo Berniz, a assunção está prevista na Lei Orgânica do município. "Pode sim. Até porque ele não está afastado das suas funções. E, de acordo com a Lei Orgânica Municipal, na ausência do prefeito e do vice, quem assume a função do Executivo é o presidente da Câmara Municipal", explicou.
No entanto, o promotor fez uma ressalva crucial: a autorização judicial vigente permite a Pelego sair de casa apenas para participar de sessões previamente marcadas na Câmara. Não há permissão para que ele atue presencialmente na Prefeitura. Para isso, seria necessário um novo pedido à desembargadora responsável. O descumprimento das regras pode resultar na revogação da prisão domiciliar e na transferência para uma unidade prisional.
Operação Tântalo II e o esquema de corrupção
O caso é um desdobramento da Operação Tântalo II, deflagrada em 22 de abril, que investiga uma organização criminosa estruturada na Prefeitura e na Câmara de Turilândia. O esquema teria desviado recursos principalmente das pastas da Saúde e da Assistência Social.
De acordo com o Ministério Público do Maranhão (MP-MA), o prefeito afastado, Paulo Curió, era a liderança do grupo e destinatário final de grande parte dos valores. O modus operandi envolvia a "venda de notas fiscais", onde empresas contratadas emitiam documentos sem prestar os serviços, devolvendo a maior parte do dinheiro ao núcleo político.
A vice-prefeita afastada, Tânia Mendes, é apontada como integrante do núcleo empresarial do esquema, atuando na movimentação dos recursos. Já a ex-vice-prefeita Janaina Lima teria um papel central, controlando uma empresa (Posto Turi) que recebeu mais de R$ 17 milhões dos cofres públicos. Ela firmou um acordo para reter 10% dos valores dos contratos, destinados ao pagamento de sua faculdade de medicina.
Além do prefeito, da vice e de Pelego, outros dez vereadores do município são investigados. Cinco deles, incluindo Inailce Nogueira, tiveram a prisão preventiva convertida para domiciliar após se entregarem. O prefeito Paulo Curió e a vice Tânya Mendes permanecem presos no Complexo Penitenciário de Pedrinhas, em São Luís.
O caso expõe as complexidades da aplicação da lei em meio a crises políticas municipais e levanta debates sobre os limites do exercício do poder por autoridades sob intensa investigação criminal.