Japão aprova orçamento recorde de US$ 785 bi em meio a dilema fiscal
Japão aprova orçamento recorde de US$ 785 bilhões

O governo do Japão deu um passo crucial nesta sexta-feira, 26 de dezembro de 2025, ao aprovar um plano orçamentário histórico para o próximo ano fiscal. A administração da primeira-ministra Sanae Takaichi autorizou gastos no valor de 122,3 trilhões de ienes, equivalente a cerca de US$ 785 bilhões, estabelecendo um novo recorde para o país.

Um ato de equilíbrio entre estímulo e prudência

O orçamento, que entra em vigor em abril de 2026 e ainda precisa da ratificação do Parlamento, reflete um delicado ato de equilíbrio. Por um lado, a medida aprofunda a política fiscal expansionista tradicional do Japão, visando sustentar a frágil recuperação econômica. Por outro, o governo tenta enviar um sinal de responsabilidade aos mercados financeiros, preocupados com a escalada da dívida pública, que já supera o dobro do Produto Interno Bruto (PIB) nacional.

Para conter a ansiedade dos investidores, Tóquio anunciou que limitará a emissão de novos títulos da dívida. A emissão de bônus soberanos subirá apenas marginalmente, de 28,6 trilhões para 29,6 trilhões de ienes. Com isso, a dependência do orçamento em relação ao endividamento cairá para 24,2%, o nível mais baixo desde 1998.

O fim da era do dinheiro barato e suas consequências

O anúncio ocorre em um momento de virada para a economia japonesa, marcado pelo fim da política de juros ultraflexíveis que prevaleceu por quase uma década. O Banco do Japão iniciou uma normalização monetária gradual, levando a uma alta nos rendimentos dos títulos públicos.

Refletindo essa nova realidade, o governo fixou a taxa de juro de referência para o orçamento em 3%, a maior em 29 anos. Esse cenário eleva significativamente o custo de rolagem da dívida. As despesas com o serviço da dívida, que incluem pagamento de juros e amortizações, devem crescer 10,8%, alcançando 31,3 trilhões de ienes. Esse aumento consome recursos que poderiam ser destinados a investimentos sociais e em infraestrutura.

Pressões orçamentárias: seguridade social e defesa

Para financiar parte da expansão recorde, o governo conta com uma arrecadação tributária projetada em 83,7 trilhões de ienes, um aumento de 7,6% e também um recorde, impulsionado pela recuperação do consumo e dos lucros corporativos.

No entanto, essa receita extra não será suficiente para cobrir todas as pressões. Duas frentes de gastos demandam atenção urgente:

  • Seguridade Social: O acelerado envelhecimento da população continua a pressionar as contas do sistema de previdência e saúde.
  • Defesa Nacional: A deterioração do ambiente de segurança no Leste Asiático, com a ascensão militar da China e as ameaças da Coreia do Norte, força um aumento nos investimentos militares.

Mudança nas regras do jogo fiscal

Em uma inflexão significativa, a primeira-ministra Sanae Takaichi sinalizou a intenção de abandonar a rígida meta de equilíbrio primário das contas públicas no curto prazo. A ideia é substituí-la por um objetivo de médio prazo, oferecendo maior flexibilidade para políticas anticíclicas em momentos de crise.

Essa proposta divide especialistas. Para alguns economistas, a mudança é realista e necessária diante do novo cenário econômico global. Para outros, ela representa um risco de relaxamento fiscal permanente, algo perigoso para um país com uma dívida colossal e uma base tributária que pode encolher no longo prazo devido à demografia.

O orçamento aprovado nesta semana sintetiza o dilema central do Japão contemporâneo: como fomentar o crescimento econômico, manter um estado de bem-estar social robusto e fortalecer as capacidades de defesa, tudo isso sem perder o controle de uma dívida pública que já é a maior do mundo desenvolvido. O governo de Takaichi tenta caminhar nessa corda bamba, prometendo estímulo suficiente para evitar uma recessão, mas sem abalar a confiança dos mercados que, por décadas, financiaram o Estado japonês a juros baixíssimos.