Os casos de Acidente Vascular Cerebral (AVC) apresentam uma tendência preocupante de aumento durante os meses de verão. O alerta é feito pelo neurocirurgião e neurorradiologista intervencionista Orlando Maia, do Hospital Quali Ipanema, no Rio de Janeiro. Segundo o especialista, uma combinação de fatores típicos da estação mais quente do ano eleva significativamente o risco da população sofrer um derrame cerebral.
Por que o verão é um período crítico para o AVC?
O médico explica que o calor intenso é um dos principais vilões. A desidratação natural causada pelas altas temperaturas torna o sangue mais espesso e concentrado. Essa condição favorece a coagulação sanguínea, um mecanismo diretamente ligado ao tipo mais comum de AVC, o isquêmico, responsável por cerca de 80% dos casos. "O AVC está ligado a coágulo", resume Maia.
Além da desidratação, outras mudanças no organismo contribuem para o risco. A pressão arterial tende a baixar no verão devido à vasodilatação, uma reação do corpo para compensar o calor. Essa queda na pressão também pode facilitar a formação de coágulos e o surgimento de arritmias cardíacas, batimentos irregulares do coração que podem gerar êmbolos. Cerca de 30% do sangue bombeado pelo coração vai para o cérebro, portanto, um coágulo formado no órgão tem alta probabilidade de causar um AVC.
Hábitos de verão e fatores de risco agravantes
O período de férias, paradoxalmente, pode ser um perigo. As pessoas tendem a relaxar nos cuidados com a saúde, o que inclui o aumento no consumo de bebidas alcoólicas, que piora a desidratação e pode induzir arritmias. A negligência também leva muitos a esquecer de tomar medicamentos de uso contínuo, como os para controle de pressão arterial.
Doenças comuns da estação, como gastroenterites com diarreia, insolação e esforço físico excessivo, somam-se a esse cenário, desidratando ainda mais o organismo. O tabagismo é apontado como uma das maiores causas externas de AVC, atuando tanto no tipo hemorrágico (20% dos casos) quanto no isquêmico. A nicotina danifica os vasos sanguíneos, reduzindo sua elasticidade e promovendo inflamação que facilita o acúmulo de placas de colesterol.
O estilo de vida moderno, com esses fatores combinados, tem feito com que a doença apareça em pessoas cada vez mais jovens, com menos de 45 anos. No Hospital Quali Ipanema, a média de atendimentos salta para cerca de 30 pacientes por mês no verão, o dobro do registrado em outras épocas do ano.
Prevenção, sintomas e a importância do tratamento rápido
Orlando Maia é enfático: o AVC tem prevenção e tratamento. A prevenção passa por hábitos de vida saudáveis: prática regular de exercícios, alimentação balanceada, controle rigoroso da pressão arterial, uso correto de medicamentos e abandono do cigarro.
Reconhecer os sintomas é crucial para um desfecho positivo. Os principais sinais são:
- Paralisia súbita de um membro ou de um lado do corpo.
- Fala enrolada ou dificuldade para se expressar.
- Perda súbita da visão, especialmente de um lado.
- Tontura extrema e desequilíbrio.
- Perda súbita da consciência.
"É uma emergência médica. Não se deve esperar", alerta o neurocirurgião. Existem dois tratamentos principais. O primeiro é a infusão de um medicamento trombolítico na veia, que dissolve o coágulo, e deve ser aplicado em até 4 horas e meia após o início dos sintomas. Para casos mais complexos, ou quando o remédio não é suficiente, realiza-se uma trombectomia mecânica: um cateter é inserido pela virilha até o cérebro para aspirar o coágulo. Este procedimento pode ser feito em até 24 horas em casos selecionados.
O AVC é uma das principais causas de morte e incapacidade no mundo, frequentemente deixando sequelas graves como paralisias, dificuldades de fala e perda de autonomia. A mensagem final do especialista é de alerta e esperança: com prevenção e busca imediata por atendimento, é possível evitar e tratar essa doença que, segundo ele, atingirá uma em cada seis pessoas ao longo da vida.