Após 50 anos, corpo de Tenório Jr., pianista morto na ditadura argentina, é identificado
Corpo de pianista Tenório Jr. identificado após 50 anos

Passados quase 50 anos de seu desaparecimento, o corpo do pianista brasileiro Francisco Tenório Cerqueira Júnior, o Tenório Jr., foi finalmente identificado. A certidão de óbito do músico, morto durante a ditadura argentina, foi emitida pelo 4º Ofício do Gama, no Distrito Federal, conforme confirmação do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania ao g1 nesta terça-feira (23).

O longo caminho até a identificação

A emissão do documento foi um pedido da Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos. A identificação dos restos mortais do artista, no entanto, só ocorreu em setembro deste ano, 49 anos após seu desaparecimento em Buenos Aires.

A confirmação veio por meio de exames de impressões digitais, realizados com o apoio da Justiça argentina e da Embaixada do Brasil. No mesmo mês, a família recebeu o laudo oficial que aponta a causa da morte.

A violência da execução e o contexto histórico

O laudo revela que Tenório Jr. foi executado com cinco tiros: um na cabeça, dois no braço esquerdo e três no tronco. Seu desaparecimento ocorreu em março de 1976, às vésperas do golpe militar argentino, em um contexto de repressão coordenada pelas ditaduras sul-americanas, conhecido como Operação Condor.

Investigações indicam que o pianista foi confundido com um militante político e detido por agentes do serviço secreto da Marinha argentina. Ele teria sido levado para a Escola de Mecânica da Armada (ESMA), um centro clandestino de detenção e tortura, onde ficou por nove dias antes de ser morto.

Seu corpo foi encontrado em 20 de março de 1976 em um terreno baldio e enterrado como indigente no Cemitério de Benavídez. Na época, a censura da ditadura militar brasileira abafou a repercussão do caso.

O legado musical interrompido

Nascido no Rio de Janeiro em 4 de julho de 1940, Tenório Jr. se tornou um dos grandes nomes do samba-jazz e da bossa nova. Aos 15 anos iniciou sua trajetória musical e, na década de 1970, era figura central no Beco das Garrafas, reduto da música instrumental em Copacabana.

Com estilo sofisticado, ele colaborou com gigantes da MPB:

  • Vinicius de Moraes
  • Toquinho
  • Wanda Sá
  • Leny Andrade
  • Edson Machado

Em março de 1976, ele estava em turnê pela Argentina e Uruguai ao lado de Vinicius, Toquinho, Mutinho e Azeitona. Após um show no Teatro Gran Rex, em Buenos Aires, saiu do hotel Normandie e nunca mais foi visto.

A identificação de seu corpo, quase meio século depois, traz um ponto final a uma longa e dolorosa espera da família e reafirma a necessidade de memória e justiça para as vítimas dos regimes autoritários na América do Sul.