Reforma Tributária 2026: Novo Sistema Começa com Transição Desafiadora
Reforma Tributária: Novo Sistema Começa em 2026

O Brasil dá o primeiro passo concreto para desatar o nó tributário que há décadas emperra a economia. A partir de 1º de janeiro de 2026, inicia-se oficialmente o período de adaptação para o novo sistema de impostos sobre consumo, desenhado pela reforma tributária promulgada em dezembro de 2023. A mudança, que será gradual até 2033, promete substituir um labirinto de milhares de normas por um modelo inspirado no Imposto sobre Valor Agregado (IVA), mas o caminho até lá é repleto de ajustes complexos para empresas e governos.

O Fim do Labirinto: CBS e IBS Substituem Cinco Tributos

A reforma extingue cinco tributos federais, estaduais e municipais: PIS, Cofins, IPI, ICMS e ISS. Em seu lugar, serão instituídos dois novos: a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), de competência federal, e o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), que será compartilhado por estados e municípios. A principal inovação é o fim da cobrança em cascata, onde imposto incidia sobre imposto. No novo modelo, tributa-se apenas o valor agregado em cada etapa da cadeia produtiva, com créditos recuperáveis.

O sistema atual é notório por sua complexidade. Para ilustrar, uma fábrica que precise declarar o IPI mensalmente se depara com uma tabela de 460 páginas e mais de 3 mil itens, cada um com uma alíquota específica. A confusão se multiplica com o ICMS, que tem 27 legislações estaduais diferentes, e o ISS, que soma outras 5.569 normas municipais. A promessa é que tudo isso seja unificado sob uma legislação nacional única.

Transição Gradual e os Desafios Imediatos para 2026

A substituição não será brusca. O cronograma estabelece uma transição gradual entre 2027 e 2033. Porém, já em 2026, as empresas (exceto as do Simples Nacional e MEIs) terão uma tarefa crucial: começar a indicar nas notas fiscais uma pequena parcela referente à CBS e ao IBS. O objetivo deste ano é de teste e adaptação.

Bernard Appy, ex-secretário da Fazenda e um dos arquitetos da reforma, ressalta que a ideia para 2026 não é punir, mas preparar. "O ano de 2026 é de adaptação, porque há uma série de adequações que não são simples e todas as empresas precisam chegar preparadas para 2027", afirma. A Receita Federal usará os dados coletados nesse período para calibrar a alíquota final, estimada em torno de 28% para a soma de CBS e IBS, com o objetivo de manter a arrecadação atual.

No entanto, a corrida contra o tempo é intensa. Luis Wulff, CEO da consultoria Tax Group, aponta que pouquíssimas empresas conseguiram atualizar seus sistemas de emissão de nota fiscal a tempo. A demanda por consultorias explodiu, e a própria Receita precisa definir normas e estruturar um sistema de processamento de dados gigantesco para sustentar o novo modelo.

Impactos Setoriais: Alívio para a Indústria, Aperto para Serviços

Os efeitos da reforma não serão uniformes. Enquanto alguns setores comemoram, outros se preparam para um aumento significativo da carga tributária.

A indústria deve ser uma das grandes beneficiadas. Por ter cadeias longas de fornecimento, ela sofre muito com a cumulatividade de impostos no sistema atual. Com o IVA e a plena recuperação de créditos, a carga nominal, que hoje pode chegar a 45,9%, tende a cair para a alíquota unificada estimada. "Será uma redução de mais de 17 pontos percentuais", calcula Flávio Unes, da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp). Essa redução tem potencial para chegar mais barata ao consumidor final.

Já o setor de serviços enfrenta um cenário mais desafiador. Empresas como a Digisystem, fornecedora de tecnologia, projetam um aumento de 60% somente na contribuição federal (CBS) em relação ao que pagam hoje de PIS e Cofins. Quando o IBS entrar em cena, a soma das alíquotas pode chegar aos 28%. "Os serviços são os que terão o maior aumento de carga e vão precisar reduzir margem", afirma Sarina Manata, assessora jurídica da FecomercioSP. Muitas empresas terão de lidar com um fluxo totalmente novo de créditos tributários, uma complexidade administrativa que não existia antes.

Apesar dos percalços da transição, que especialistas como Mariana Carneiro da PwC avaliam que "vão piorar antes de melhorar", o consenso é de que o saldo final será positivo. Carlos Renato Vieira, especialista em tributação, define o sistema atual como "litigioso, ineficiente e gerador de custos elevados". A expectativa é que, superada a "via-crúcis" da transição até 2033, o país tenha um ambiente de negócios mais moderno, transparente e competitivo.